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Carta do Gestor - Fevereiro de 2015

Prezado investidor,

Durante o mês de fevereiro o nosso portfólio subiu 7,6%, apresentando uma pequena recuperação de preços neste longo ciclo de mercado em baixa. Esta recuperação, entretanto, ainda não deve ser vista como uma inflexão de tendência. Estamos atravessando um momento crucial para o país, tanto do ponto de vista econômico quanto político. A volatilidade deve continuar elevada pelos próximos meses.


Ao longo do mês, a Moody’s rebaixou para grau especulativo a classificação da Petrobrás, empresa mais endividada do mundo e responsável por 10% dos investimentos no país. Esse anúncio já era amplamente esperado pelo mercado e, na prática, indica que a luz amarela pode começar a dar espaço para a luz vermelha. O dólar norte-americano se valorizou em relação às principais moedas do planeta, em particular o real, que perdeu quase 6% do valor em fevereiro e já acumula quase 15% desde as eleições de outubro.


As primeiras medidas de ajuste fiscal anunciadas por Joaquim Levy já começaram a provocar reações negativas de diversos setores da sociedade, em particular dos sindicatos e de boa parte da base aliada de Dilma. Os cortes de subsídios e de gastos são parte do esforço fiscal para se atingir 1,2% de superávit primário. O aumento nos preços de combustíveis (ao contrário do que ocorre no resto do mundo) e nas tarifas de energia elétrica impulsionou as expectativas de inflação para perto de 8% para 2015. Mesmo após a elevação da taxa Selic para 12,75% ao ano no início de Março, os mercados trabalham com novas elevações.


O governo, de forma pouco transparente, começou a restringir o financiamento estudantil, através do FIES. Milhões de estudantes perderão seus anos letivos e estão revoltados. Os caminhoneiros paralisaram rodovias em protesto contra a forte elevação no preço do diesel e o governo utilizou a Força de Segurança Nacional, para combatê-los -- algo que não ocorre quando quem paralisa as estradas faz parte do grupo de marginais como, por exemplo, o MST, um notório apoiador o governo. Foi interrompido o programa Minha Casa Melhor, no qual linhas de crédito de até R$ 5.000 foram oferecidas para as famílias que compraram sua casa através do programa MCMV. A inadimplência nestas linhas chegou a 30% em menos de dois anos de efetividade. Cumpriu seu papel eleitoral, entretanto.


Neste cenário de inflação elevada e recessão moderada, com expectativa de queda do PIB em até 2%, a confiança dos consumidores e empresários segue debilitada. Os incorporadores preveem novamente um ano difícil, após a queda nos lançamentos em mais de 30% em 2014. A indústria automobilística, que sofreu retração de 20% em 2014, deve se retrair novamente, entre 5% e 10% este ano. Por fim, o escândalo que já ganhou as páginas dos principais jornais do planeta, o Petrolão, vem provocando uma paralisia em toda a cadeia de fornecedores de bens e serviços para a Petrobrás, muitos dos quais empresas diretamente envolvidas com a Operação Lava-Jato.


A taxa de desemprego veio de 4,8% para 5,30% em janeiro, com destaque para a piora na região metropolitana de Salvador, onde a taxa se aproximou de 10%. Neste ambiente em franca deterioração, a popularidade da presidente Dilma Rousseff despencou para 7%, algo sem precedentes para um presidente recém-eleito e com menos de três meses de mandato.


Em 15 de Março, quase 2,5 milhões de brasileiros indignados se reuniram de forma pacífica para pedir o fim da corrupção e o impeachment da presidente Dilma por crime de responsabilidade. Apenas na cidade de São Paulo foram mais de um milhão de pessoas, na maior aglomeração registrada num protesto desde 1984, quando houve a campanha pelas eleições diretas.


Os depoimentos de alguns ex-diretores da Petrobrás assim como executivos das empresas envolvidas em corrupção junto à Petrobrás tem municiado o Ministério Público com evidências e provas de que parte dos recursos desviados da estatal foi utilizada para financiar campanhas eleitorais do PT e partidos aliados, em particular a campanha que elegeu a presidente em 2010. Sabemos que o impeachment é um processo político que é amparado pela combinação de provas ou evidências de crimes de responsabilidade pelo presidente e pelo povo nas ruas protestando. Neste ritmo, a probabilidade de que a presidente não chegue ao final de seu mandato vem aumentando.


Atribuímos hoje 25% de probabilidade para a interrupção deste governo ainda em 2015. Apesar das evidências contra a presidente e da sua popularidade irrisória, o fato de que o seu vice possa cair junto, assim como o envolvimento de dezenas de congressistas, tornam este processo pouco trivial. Sobreviver a ele sem grandes traumas será um grande teste para as instituições nacionais.

Em nosso cenário base, ainda contemplamos o ajuste fiscal entre 2015 e 2016 conduzidos pelo atual ministro da fazenda e que, se bem sucedido, devolverá a credibilidade ao país. Sem a atual crise de confiança, cujas reações são exacerbadas, os fundamentos de longo prazo do país devem voltar a prevalecer.


Achamos muito pouco provável tanto o cenário de a presidente tentar resistir ao impeachment eventualmente aprovado pelo Congresso, o que poderia provocar uma guerra fratricida no país, quanto o cenário onde ela abandonaria a ortodoxia ora adotada por sua equipe econômica e partisse para uma guinada mais à esquerda, seguindo os fracassados modelos argentino e venezuelano. Caso a pouca iluminação desta senhora a leve para estes caminhos, seguramente os preços dos ativos estarão ainda mais depreciados do que os atuais.


Infelizmente a prevalência de questões políticas e macroeconômicas ofuscam notícias positivas vindas de diversas empresas. A maioria das empresas de nosso portfólio conseguiu, a despeito do cenário desafiador, entregar bons resultados no quarto trimestre de 2014.


Em nosso portfólio as empresas ligadas a área financeira, de saúde e de logística destacaram-se positivamente com resultados bastante sólidos e crescimento -- apesar do crescimento das despesas financeiras devido à elevação dos juros. Já as empresas ligadas a commodities tiveram resultados mais fracos, com destaque para Vale, a qual apesar do crescimento de produção e vendas, já sentiu os efeitos da forte queda nos preços do minério. Aqui destacamos que este grupo de empresas se beneficia de um real mais depreciado, mas durante o ajuste reconhecem perdas contábeis referentes às dívidas em moeda estrangeira.


Como não podia deixar de fazer, lembro aos investidores de que os preços dos ativos hoje, salvo para empresas consideradas “portos-seguros”, estão muito depreciados e contemplam tanto a elevada taxa de juros (os quais já ultrapassa os 13% ao ano), quanto a elevada volatilidade que afeta a taxa de risco exigida pelos investidores. Também há expectativas baixas quanto ao crescimento das empresas para os próximos anos. Aos primeiros sinais de melhoria, a porta de entrada parecerá estreita aos potenciais investidores de Brasil. A liquidez global está e seguirá bastante elevada e boas oportunidades de retorno deverão atrair parte deste fluxo, quando o arcabouço macro institucional e regulatório se mostrarem menos hostis aos investidores.


Aqui cabe utilizar a famosa frase, dirigida à presidente Dilma, atribuída a quem não foi exatamente um exemplo de homem trabalhador, nosso ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva: “Deixa o homem trabalhar”.


Atenciosamente,

André Gordon

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