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Carta do Gestor - Dezembro de 2015

Prezado investidor,


O mês de dezembro foi bastante negativo e ilustrou bem o que foi este ano de 2015, um ano que nós brasileiros provavelmente não esqueceremos tão cedo.


A crise política sem precedentes e a combinação de uma grave crise conjuntural com sérios problemas estruturais, que já apresentavam sinais de fadiga, levou a confiança dos empresários e dos consumidores para os menores níveis da nossa história e isso contribuiu para uma queda acentuada no nível de emprego e do produto.


Um dos poucos setores que seguiu gastando como se não houvesse amanhã, pasmem, foi justamente o setor público, maior vilão desta história. O problema deste excesso de gastos públicos aliado a uma arrecadação que colapsou junto com a retração da economia é a piora nos indicadores financeiros do setor público. A combinação deste déficit operacional da ordem de dois dígitos com os ajustes de preços de tarifas públicas e combustíveis levou nossa inflação também para dois dígitos, numa perigosa dinâmica. O BC tem tido grande dificuldade em trazer as expectativas de inflação de volta para a meta uma vez que trabalha em total dissonância com a Fazenda. Esta, por sua vez, indica que nem os resultados catastróficos do setor público são suficientemente ruins para fazer com que o “espírito do bom servidor público” pudesse prevalecer sobre o populismo da pior espécie promovido pelo time moribundo da presidente.


Em meio a este embate, onde o time esfarrapado da presidente Dilma luta com unhas e dentes, chutes e caneladas, usando toda a munição que tem disponível para se segurar no poder, sobrou para o único foco de relativa seriedade no Governo: caiu o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Para o lugar do ex-ministro, assumiu Nelson Barbosa, um dos nomes responsáveis pela “Nova Matriz Econômica” promovida pelo ex-ministro Guido Mantega e que trouxe o Brasil de volta para

os anos 80. Nelson Barbosa também foi a principal voz dissidente de Joaquim Levy ao longo de todo o ano de 2015. Foi ele quem brigou para que o corte de despesas fosse menor e para que a maior parte do ajuste fiscal se desse sobre o aumento da arrecadação. Ele era o homem sombra sobre Levy e que sempre contou com a simpatia da presidente, a verdadeira formuladora destas malfadadas políticas que acompanham seu governo desde 2010.


E como se não bastasse essa infeliz troca de ministros na Fazenda, no momento em que agencias de avaliação de risco estão à espreita, por argumentos que justifiquem novos rebaixamentos na nota de crédito do país, o PCdoB, partido comunista e de orientação maoísta, cão de guarda do próprio PT e que seria apenas uma piada de mau gosto restrita ao meio político se não fosse de verdade, entrou com um ADPF (Arguição de descumprimento de preceito fundamental) junto ao STF contestando o rito do impeachment recém-iniciado. Até ai era parte esperada do jogo político. O que chamou a atenção foi a atuação de alguns ministros do Supremo, destacadamente Luis Roberto Barroso, que ignorou de forma sorrateira a Constituição Federal e acabou por determinar algumas alterações no rito que supostamente tendem a dar maior peso para o Senado Federal, casa dirigida por Renan Calheiros, corrupto conhecido e aliado da presidente.


Para nós, este sinal do STF teve um impacto muito mais psicológico sobre os ânimos deprimidos do mercado do que efeitos práticos na sequência do processo. Assustou-nos a ideia de que perdido nas ruas e no Legislativo, o Governo ainda tem como último bastião se apegar num Judiciário aparelhado e que poderia “melar” todo o longo e traumático processo. Após as votações no STF, os mercados imediatamente sentiram o golpe, golpe aqui com duplo sentido. Um dos ministros da mais alta Corte chegou a qualificar como decisão bolivariana aquela deliberada havia poucas horas.


Nossas posições em empresas mais dependentes da economia doméstica e de menor capitalização de mercado foram as que mais sofreram com este choque negativo sobre expectativas. Na verdade consideramos que, de fato, houve um esfriamento neste processo e a transferência para as ruas, novamente, da responsabilidade de convencer Brasília de que este Governo perdeu a legitimidade para seguir no comando da nação. Do ponto de vista prático, entretanto, algumas dúvidas foram criadas pelo STF como, por exemplo, o que ocorre caso a Nova Comissão Especial não consiga a maioria dos votos.


Outra modificação no novo rito do processo retirou o caráter privativo da Câmara dos Deputados em acatar o pedido de impeachment. Ao Senado também caberá, por maioria simples, acatar este pedido novamente. Entendemos que se depois de votado na Casa do Povo o Impeachment não conseguir angariar apoio deste pequeno grupo de senadores, dificilmente seria bem sucedido na deliberação final onde a maioria de dois terços é exigida.


Vida que segue e após os recessos do Congresso Nacional e do Judiciário, que devem fazer com que Janeiro seja um dos meses mais apáticos da história recente de nossa bolsa, o dinamismo e os embates políticos devem voltar a todo o vapor em Fevereiro. Os volumes negociados devem seguir muito reduzidos e neste ambiente os preços têm menor significado em termos de robustez. Só torçamos para que passe logo, pois as empresas precisam de um horizonte minimante longo para tomar decisões fundamentais em termos de investimentos. Nunca antes neste país havíamos enfrentado um cenário tão desafiador e sendo governados por pessoas tão despreparadas e descompromissadas com a prosperidade da nação.


E o que devemos esperar de 2016? Acreditamos que será um ano bastante desafiador, onde na ausência de pioras adicionais o produto terá caído em torno de 2,5% em relação ao produto de 2015 e a inflação esperada já se encontra próxima ao teto da meta. O desemprego deve sofrer nova piora com as demissões de início de ano e se aproximar do patamar de 12%. As pressões contra o Governo tendem a aumentar e temos dificuldade de acreditar que os investidores se antecipem a atitudes do governo no sentido de devolver, ainda que parcialmente, a credibilidade perdida. O lado positivo deve ficar por conta das transações correntes, com a forte redução do déficit. Essa melhora será decorrente da combinação da baixa atividade doméstica com uma taxa de câmbio mais depreciada. O Brasil também tem se mostrado atrativo para investidores de muito longo prazo, em sua busca por ativos reais. Esses investidores de países como a China parecem dispostos a adquirir participações em empresas ligadas aos setores de commodities e infraestrutura.


Os primeiros sinais emitidos pelo novo ministro da fazenda foram na linha da preservação das atuais políticas econômicas e da necessidade de algumas reformas na CLT (Legislação Trabalhista) e na Previdência. Ele só deverá colher os frutos destas políticas se conseguir aprová-las no Congresso e colocá-las em curso. Caso contrário essas “boas intenções” serão ignoradas solenemente pelos mercados.


Por fim, podemos para efeito de simplificação dividir os cenários em três principais. O cenário positivo e que ainda consideramos o mais provável, da saída da presidente, seja pelo impeachment, seja pelo TSE ou ainda por qualquer outro motivo. Neste caso os preços dos ativos deverão ser conduzidos pela substancial recuperação da credibilidade. Haverá um grande esforço de união nacional no sentido de fazer dar certo este "governo de transição”. Neste caso acreditamos que os ativos de nosso portfolio terão valorização expressiva.


O cenário neutro que é a recuperação de alguma governabilidade pela presidente à custa de algumas reformas ou minirreformas e algum ajuste fiscal, talvez até com a aprovação da CPMF. Esse cenário permitirá a sobrevivência deste governo até as eleições municipais de 2016 onde provavelmente a temperatura política voltará a subir. Os preços de ativos devem permanecer estáveis, mas com volatilidade moderada.


Por fim o cenário que hoje nos parece de menor probabilidade que seria a guinada definitiva para a heterodoxia dos anos 80 e 90. Neste caso saberemos que o futuro econômico do país estará em jogo e ainda por cima ameaçado. A inflação tende a acelerar e com ela alguns ativos reais tendem a acompanhar esse movimento de alta. Seria ruim em termos reais, mas com alguma defesa em termos nominais.


As ações, como representantes da classe dos ativos reais, tendem a ter, em situações extremas, também a função de hedge. Acreditamos que empresas como o Banco Itaú, por exemplo, não encontrarão grandes dificuldades para preservar os retornos sobre seu patrimônio líquido num patamar similar ao atual, mesmo com alguma deterioração no ambiente creditício. Seguiremos, por hora, com a mesma estratégia, acreditando que os retornos esperados estão sendo substancialmente subestimados pelo mercado pela combinação de expectativas negativas internas e aperto de liquidez externa. A faixa de chegada desta longa e conturbada maratona, parece logo ali, na esquina. Esperamos que não seja apenas uma miragem oriunda da baixa oxigenação em nossos cérebros.


Atenciosamente,

André Gordon

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