Prezado investidor,
Finalmente, no último dia deste mês de agosto, encerrou-se o processo de impeachment. Com o voto favorável de 61 senadores, 7 a mais do que o necessário, a presidente Dilma Rousseff foi definitivamente afastada da presidência e Michel Temer completará seu mandato até o final de 2018. Acreditamos que o afastamento definitivo deste projeto “cleptocrático” de poder já estava, em boa parte, precificado pelo mercado.
A partir deste momento, esperamos que o novo governo encontre condições mais favoráveis para promover o ajuste tão necessário no Estado brasileiro. Uma minirreforma ministerial poderá ocorrer, mas acreditamos que esse será essencialmente um governo de coalizão nacional. Salvo pelo PT e seus partidos auxiliares (PSOL, REDE e PCdoB), que deverão se converter numa ruidosa e raivosa oposição contra quaisquer projetos, tal como foram desde sua fundação em 1980 até a eleição do presidente Lula, os demais partidos deverão trabalhar de forma mais colaborativa. É provável que haja alterações nas propostas inicialmente concebidas pelo governo. Michel Temer, de forma oposta a sua antecessora, é extremamente habilidoso na condução política, nas negociações e na divisão de poder.
A agenda política deve começar a perder importância e a agenda econômica ocupará seu lugar. E será esta agenda de reformas que pautará o comportamento dos mercados até o final deste ano. Haverá uma redução na velocidade dos trabalhos do Congresso neste mês que antecede as eleições municipais. Porém, acreditamos que até o final do ano, a PEC dos gastos públicos, limitando seu crescimento pela inflação do ano anterior e pelos próximos 20 anos, deverá ser aprovada. Somada a já aprovada, neste mês, prorrogação da DRU até 2023 e ampliada para 30%, os gastos públicos passarão a crescer menos do que as receitas, tão logo o PIB retome seu crescimento.
Esse binômio trará a relação entre dívida e PIB para baixo, interrompendo sua trajetória de crescimento explosivo e consequentemente contribuirá para a redução nas taxas de juros reais de longo prazo.
Outra reforma fundamental e que já se mostra consensual entre todos aqueles que têm algum espírito público é a reforma da Previdência. Não há unanimidade quanto aos parâmetros que serão propostos, mas há um entendimento amplo de que a demografia atual exige um aumento para a idade mínima para a aposentadoria. As propostas preliminares apontam a elevação na idade mínima para 65 anos para os homens e 62 para as mulheres, respeitando-se o direito adquirido pelos que já se aposentaram. Haverá um regime de transição para aqueles com mais de 50 anos, sendo que descontos entre 40% e 50% seriam aplicados caso optem pela aposentadoria por tempo de serviço e antes desta nova idade mínima. As novas regras valeriam tanto para os servidores públicos quanto para os privados atendidos pelo INSS, ainda que possam ser votadas em momentos diferentes.
Fora isso, poderíamos ser contemplados com leis que modernizassem a legislação trabalhista, CLT, e uma reforma tributária que implicasse em simplificação dos impostos, preferencialmente sem o aumento de alíquotas. Estas medidas contribuiriam em muito para recuperar a competitividade das empresas brasileiras. Essa agenda deverá ser colocada ao longo de 2017.
O BC, sob o comando de Ilan Goldfajn, já tem mostrado uma postura mais ortodoxa. O início do afrouxamento monetário foi postergado para o final deste ano. Esse sinal foi muito positivo para que houvesse uma convergência nas expectativas para a inflação de 2017 e de 2018 para o centro da meta, de 4,5%.
Quanto maior a postergação do início nos cortes da taxa SELIC, mais acentuada será a queda da inflação e, tão logo iniciada, mais rápida será a queda de juros. Acreditamos que há grande chance de que este processo de redução na taxa Selic se inicie já na próxima reunião do COPOM em outubro. O BC também está aproveitando a farta liquidez para reduzir o estoque de swaps cambiais, que chegou a quase USD 100 bi, e que hoje se encontra em torno de USD 40 bi. No atual ritmo dos leilões diários este estoque será finalmente eliminado até o final do ano.
Ao longo deste mês de agosto tivemos também a felicidade de completar a recuperação do mais longo drawdown em nossa cota. Drawdown é a medida do declínio entre a cota histórica máxima anteriormente atingida e as cotas posteriores, ou seja, sua recuperação só se dá quando um novo máximo histórico é atingido. E destacamos este feito, investidores de longo prazo que somos, porque corrobora nossa tese central de que boas empresas, apesar de não serem blindadas quanto às intempéries do mercado, têm resiliência em suas operações de forma que tão logo os sinais de melhora se apresentem, essas empresas voltam a brilhar, assim como o reflexo deste brilho nos preços de suas ações.
O índice IBOVESPA encerrou o mês de agosto com alta de 1,02%, enquanto nosso fundo o superou pelo sétimo mês consecutivo, desta vez com alta de 1,65%. Muitos questionam se não estariam os ativos ficando caros. Para estes, devolvo com outra pergunta: você acredita no cenário acima descrito? Em caso afirmativo, a nossa atividade econômica entrará num ciclo virtuoso como há muito não víamos. Os resultados das empresas começarão a dar sinais de recuperação e os investidores avaliarão estas mesmas empresas utilizando-se de custos de capital menores, dado o menor risco macroeconômico. Provavelmente, sob estas condições, os preços de hoje parecerão ainda muito baratos.
Encerramos está carta mensal lembrando nossos leitores de que havíamos antecipado que, na hora em que o risco de que nosso país se tornasse uma Venezuela ou Argentina se dissipasse, estaríamos certamente com o preço dos ativos noutro patamar. Desde janeiro deste ano, quando poucos acreditavam que o governo Dilma terminaria antes de dezembro de 2018, até o presente momento, não foram poucas as ações que dobraram de preço.
Provoco nossos leitores de forma análoga: na hora em que as reformas acima deixarem de ser fator de risco para fazer parte de nossa vida econômica os preços dos ativos estarão, novamente, num outro patamar muito superior ao atual. Obviamente assumindo que o cenário externo seguirá com elevada liquidez e que os ativos brasileiros seguirão oferecendo taxas de retorno muito superiores àquelas das principais economias do planeta.
Atenciosamente,
André Gordon
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