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Foto do escritorAndré Gordon

Carta do Gestor - Agosto de 2015

Prezado investidor,


Iniciei a carta do mês de julho comentando sobre o final da lua de mel entre o mercado e o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Comentei, entretanto, que o casamento continuava. No mês de agosto podemos afirmar que o casamento entrou em DR (Discussão sobre o Relacionamento). Levy tem sido humilhado e desprestigiado publicamente pelos ministros da Casa Civil, Aloisio Mercadante e do Planejamento, Nelson Barbosa. Ele já havia perdido a batalha pelo tamanho dos cortes de despesas logo no início de seu trabalho. A cada oportunidade que aparece, a turma adepta da heterodoxia tenta enfraquecer este elemento estranho ao governo PT. Tudo indica que a presença de Levy, símbolo de alguma gestão responsável, está com os dias contados. Não há e não parece que haverá, no horizonte visível, compatibilidade mínima e que garanta um trabalho que necessariamente precisaria de uma equipe coesa e alinhada. Mesmo a gravidade da atual situação econômica conjugada com uma crise política sem precedentes parece ter acordado o núcleo do Governo para a importância deste que consideramos o último fiador deste governo desastrado.


E estando Levy por um fio, o que podemos esperar para o país? Seria o final dos tempos? Chegou a hora de assumirmos que o caminho sem volta e inevitável, agora, seria o de “venezualização” ou “argentinização” de nossa economia? A resposta no momento é: o Brasil ainda tem mecanismos para evitar que o pior aconteça de forma que a saída do Ministro Levy poderá ser o estopim para a queda da presidente Dilma Rousseff.


Os boatos sobre a saída do Ministro Levy já foram suficientes para provocar grandes oscilações nos principais preços da economia. A cotação do dólar atingiu o maior nível desde outubro de 2002, quando havia o pânico em relação à futura política econômica a ser praticada pelo presidente eleito Lula.

Houve um deslocamento para cima nas taxas de juros dos títulos brasileiros, apesar da manutenção da taxa Selic em 14,25% ao ano, indicando o fim deste último ciclo de aperto monetário. O índice IBOVESPA, em dólares, atingiu um nível inferior ao do pior momento da crise de 2008 e mais triste ainda, o mesmo nível atingido há 18 anos, em junho de 97, época da privatização da Telebrás. Já houve uma queda em dólares de quase 45% no IBOVESPA desde as últimas eleições.


O desemprego segue subindo e já atingiu 7,5%, vindo de 4,9% às vésperas das eleições. O índice de preços segue resiliente apesar do aperto monetário e a renda real disponível começou a ceder, contribuindo para o círculo vicioso. A queda do PIB pelo segundo trimestre consecutivo, desta vez de 2,6%, contribui para a deterioração nas contas públicas e terminaremos o ano com déficit primário pela primeira vez desde 1998. Não é preciso ser especialista para antecipar que muito em breve as principais agências de classificação de risco rebaixarão o país para o grau especulativo. Os atuais preços de mercado dos ativos já são compatíveis com essa nova classificação. Para que isto não ocorra, será necessário o Governo começar a ter seriedade nas suas promessas de ajuste fiscal e ao invés de buscar elevar ainda mais os impostos que hoje ultrapassam os 37% do PIB, reduzir suas despesas. Será importante e imprescindível promover uma reforma previdenciária de forma a adaptar os parâmetros à atual realidade demográfica brasileira. Perto deste grande rombo nas contas públicas, os demais parecem pequenos.


Neste momento onde os riscos macroeconômicos e politico-institucional predominam sobre os riscos microeconômicos, podemos dizer que mesmo setores exportadores tradicionais tiveram desempenho negativo por conta da desaceleração da economia chinesa. A exceção foi o setor de papel e celulose onde o preço da celulose segue elevado e as receitas são dolarizadas enquanto a maior parte dos custos em reais.

Empresas com ativos fora do país também têm sido preservadas desta profunda correção de preços.


Vou concluir a carta deste mês, novamente, com uma árvore dos cenários que estamos utilizamos para amparar nossas decisões de investimento, assim como as probabilidades que atribuímos a cada um deles.


Primeiro dividimos em dois grandes cenários: com e sem a presidente Dilma no comando do país, nos próximos meses. Atribuímos hoje a probabilidade de 40% para que a presidente saia, seja pela improvável renúncia, seja pelo início de um processo de Impeachment por Crime de Responsabilidade em função das pedaladas fiscais ou mesmo como consequências da Operação Lava Jato e por fim, pela cassação de seu mandato pelo TSE devido a crimes eleitorais relacionados ao financiamento de sua campanha, como alguns já denunciados pelo Ministro Gilmar Mendes. Obviamente a sucessão da presidente seria diferente de acordo com o sub cenário acima. No caso de renúncia ou do impeachment, assumiria o vice-presidente Michel Temer.


No caso de cassação de sua chapa, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, assume e convocaria novas eleições em 90 dias, onde o potencial candidato Aécio Neves seria o grande favorito. Acreditamos que um grande acordo político tende a predominar na determinação de qual o cenário acima ocorrerá, salvo fato novo e que comprometa os nomes em questão. Ainda que a saída através do vice-presidente seja a mais provável, consideramos desprezível a chance de descontinuidade institucional em qualquer destes cenários. Dito de outra forma, a saída de Dilma nos próximos meses deverá levar à formação de uma base ampla de governo e que terá força para liderar as reformas necessárias para devolver a estabilidade à política e à economia. Neste cenário benigno, acreditamos que o Real, assim como as ações de empresas brasileiras se valorizará rapidamente.


No segundo cenário, com Dilma seguindo no poder, temos basicamente três sub cenários. O primeiro deles e com probabilidade de 25% de que Dilma continua, a crise política se arrefece junto com os primeiros sinais de estabilização da inflação e estabilização dos indicadores econômicos. O país seguirá com remendos de reformas, projetos-lei e medidas provisórias e a trajetória de crescimento baixo, entre 1% e 2%, à partir de 2017, sustentados por melhora da balança comercial e com inflação sobre a meta. E um cenário onde o Real deverá permanecer depreciado e a bolsa de lado.


O segundo e também com probabilidade de 25% é o de que Dilma insiste em ficar, mas se mostra incapaz de promover quaisquer medidas em favor da retomada de uma governabilidade mínima. Os protestos de rua devem continuar conforme as condições econômicas e sociais dos brasileiros se deteriorem ainda mais. Este cenário deverá levar novamente ao primeiro cenário, de afastamento da presidente. Neste caso o drama será prolongado por sabe-se lá mais quantos meses. Todas as variáveis macroeconômicas estarão mais frágeis, exceto aquelas relacionadas às transações correntes.


Por fim, o cenário que consideramos menos provável, com apenas 10% de chances é a de que a presidente cede aos descontentes de seu partido, o PT e volta à todo vapor para a heterodoxia. Sabemos pelas lembranças dos anos 80 e início dos anos 90 que este cenário pode ser prolongado por alguns anos devido à enorme capacidade e inventividade que os brasileiros possuem. Não podemos esquecer, entretanto, que um enorme contingente de pessoas que ascenderam à classe média não aceitará passivamente seu empobrecimento devido ao imposto inflacionário que fatalmente cobrará sua fatura enquanto os magos da economia tentarão suas mágicas. Este cenário será o pior para o comportamento de preços dos ativos em Real, tamanha a desorganização que ele provocará na economia.


No limite, os desajustes se ampliam e o governo monetizará a economia antes de dar um calote interno. Triste para um economista ter que incluir este tipo de cenário, que parecia restrito aos livros de história, depois de mais de 20 anos.


O momento é crítico e nestas horas, para aqueles que têm horizonte de investimento mais longo e acreditam que o país seguirá sua trajetória secular de crescimento, encontram-se as boas oportunidades de investimento para a obtenção de retornos diferenciados.

Como diz a placa na academia de musculação “No pain, no gain”.


Atenciosamente,

André Gordon

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