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Foto do escritorAndré Gordon

Carta do Gestor - Março de 2023

Prezados cotistas,


No mês de março, o S&P 500 subiu 3,5% enquanto o Nasdaq 9,5%. O esboço de uma nova e grave crise bancária surgiu com o colapso do Silicon Valley Bank (SVB), décimo sexto maior banco norte-americano. A velocidade do socorro à instituição, ainda no final de semana, garantindo aos correntistas o recebimento integral de seus depósitos, impediu que a crise de confiança no sistema se agravasse. Dias depois, o Credit Suisse também apresentou problemas de confiança e acabou sendo comprado pelo UBS por uma fração de seu valor histórico recente, com suporte do SMB (Banco Central Suíço) e do Governo Suíço.


O forte aperto monetário em curso nos EUA tem contribuído para a desaceleração da atividade econômica e da inflação. Como efeito colateral, entretanto, houve uma expressiva deterioração nos indicadores de inadimplência, o que colocou em risco tanto os devedores high yield, quanto as instituições financeiras em situação mais delicada. Ficou a lição de 2008, no episódio da Lehmann Brothers, e as lembranças traumáticas impediram que os formuladores de política econômica “pagassem para ver” as eventuais consequências no caso de ausência ou atraso no socorro ao sistema. O mercado financeiro, que trabalhava com até 3 elevações na taxa básica de juros norte-americano para o nível de 5,5%, reduziu suas projeções para apenas um aumento, ocorrido em 22/3 e já trabalha com o início da queda de juros ainda neste ano de 2023. O reflexo desta ponderação em favor da atividade, em relação ao nível de preços, contribuiu para uma elevação de preços nos ativos reais, principalmente de empresas de maior crescimento.


No Brasil, esse movimento positivo nos preços dos ativos não ocorreu, apesar da valorização do Real frente ao dólar, em linha com a maioria das demais moedas. O governo havia anunciado que anteciparia a apresentação do novo arcabouço fiscal em substituição ao “Teto de Gastos”. Os atrasos deste anúncio, contudo, talvez tenham sido um preambulo do que viria adiante. Foi apresentado um plano confuso e bastante aquém do desejado. Ao invés de atacar nosso maior problema fiscal que se encontra no excesso de gastos do Estado, o arcabouço teve ênfase no aumento da arrecadação, que por sua vez induziria a um aumento de gastos em menor velocidade, mas ainda positivo em termos reais. Não ficou claro em nenhum momento os detalhes de onde poderia vir essa elevação na arrecadação, sendo mencionado que viria de setores como o de apostas virtuais, comércio eletrônico, de difícil fiscalização e com o fim de incentivos tratados por “jaboticabas tributárias”.


Obviamente que, tal como jabuti, que não sobe em árvore, se esses incentivos estão lá é porque alguém, lá, os colocou. Esse lobbies costumam ser muito fortes, como por exemplo o da SUFRAMA (Zona Franca de Manaus), sendo que o processo para que sejam retirados pelo Congresso Nacional demandaria uma força e uma maioria de deputados e senadores que o atual governo está longe de ter demonstrado conseguir. A sensação que ficou é que o governo tenta ganhar tempo e continuar gastando, enquanto tenta fazer do BCB um bode expiatório e culpado pela difícil situação em que nos encontramos. Esses ataques ao BCB não são feitos sem o devido cálculo político, apesar de que ficamos com a impressão oposta. Lula coloca as suas fichas, novamente, no nós contra eles, transformando seu governo em vítima de um sistema formado pelos “malvados capitalistas e banqueiros”.


A opinião pública, muitas vezes, compra essas narrativas que, supreendentemente, ainda contam com certa defesa, ainda que envergonhada, de inúmeros jornalistas e comentaristas de importantes emissoras de TV e de rádio. Infelizmente, esses ruídos, apenas tornam o trabalho do BCB mais difícil e delicado, haja visto que garantir o cumprimento das metas de inflação e o poder de compra do Real seriam suas principais atribuições. O atual presidente do BCB é bastante discreto em seus comentários, o que evitou que os prejuízos à sociedade pudessem ser ainda maiores.


O COPOM manteve a taxa Selic em 13,75% e deixou sinais de que aguarda acenos no sentido de alguma disciplina fiscal pelo Governo. O Ibovespa caiu 2,9% enquanto os nossos fundos GTI DIMONA, GTI HAIFA e GTI NIMROD tiveram quedas de 2,84%, 2,24% e 2,99%, respectivamente.


Um dos destaques do mês ficou por conta das ações da Unifique, empresa de telecomunicações que oferece serviço de fibra ótica na região sul do Brasil. A empresa segue cautelosa nas suas aquisições, levando em conta os passivos ocultos que costumam ser frequentes nos pequenos provedores de acesso regionais. Costumamos dizer que empresas com acionista controlador com posição relevante, como neste caso, costumam ser mais disciplinadas do que empresas onde há um desalinhamento entre os interesses entre a administração e acionistas, muitas vezes remunerados por critérios como faturamento, Ebitda, número de clientes etc, mas que no longo prazo podem se mostrar destruidores de valor.


Temos notado esse risco como crescente, ainda mais diante da presença cada vez mais frequente de grandes fundos de investimentos nas bases de acionistas, mas que nos parecem mais preocupados em garantir que as empresas investidas atendam às suas demandas mais diversas que não a geração de fluxo de caixa para os acionistas ou a maximização de seu valor de mercado. Como destaques negativos, nossas pequenas posições nos segmentos de serviços e varejo, ainda que menos discricionário, tiveram fortes quedas.


O nível de preço das ações já se encontra em patamar historicamente muito baixo, boa parte explicado por fatores técnicos. Diante de uma taxa de juros superior a 1% ao mês, sem falar nos títulos incentivados como CRAs e CRIs, isentos de IR, e sem perspectivas de que o governo fará sua parte no campo fiscal, para que o BCB possa iniciar o ciclo de corte de juros, os investidores tem migrado de suas aplicações de maior risco para os fundos DIs e títulos incentivados, além do Tesouro Direto. Os setores que mais tem sofrido são aqueles relacionados ao varejo e serviços, principalmente quando se considera o risco de crédito. As inconsistências contábeis e o rombo multibilionário nas contas das Lojas Americanas foram o preambulo de que uma crise de crédito possa estar em curso. As Lojas Marisa reportaram no trimestre um prejuízo do tamanho de seu valor de mercado e sinalizaram para a necessidade de capitalizar seu braço financeiro. Grandes nomes como Via Varejo e Magazine Luiza enfrentam forte concorrência de empresas mais eficientes e capitalizadas como Mercado Livre e Amazon e acabam trazendo um sentimento de dejà vu aos investidores.


Diante do exposto acima, muitos poderiam acreditar que estamos “pessimistas” quanto aos investimentos em nossos fundos, neste atual momento. Estamos sim, um tanto céticos quanto as ações do governo no campo fiscal, isso é verdade. Por outro lado, as boas empresas brasileiras estão acostumadas com conjunturas macroeconômicas mais desafiadoras. Os preços de hoje oferecem perspectivas de retorno futuro muito mais atrativas, obviamente desconsiderando o cenário no qual sofreríamos um processo de “venezuelização” ou “argentinização” de nossa economia. Lembramos que essas empresas nas quais investimentos, têm situações de dominância em seus respectivos mercados e, não em poucas vezes conseguem seguir expandindo suas receitas, mesmo em ambientes recessivos. Também têm situação financeira e patrimonial geralmente mais confortáveis de que de seus principais concorrentes, de forma que a consequência de um período turbulento mais longo é a conquista de market share e subsequente recuperação de valor potencializada. Boa parte de nosso portfólio segue investida em empresas relacionadas a commodities e com receita mais dependente da economia global do que da economia doméstica, ajudando a suavizar um pouco a turbulência que ocorre com empresas domésticas, principalmente as chamadas small e mid caps.


Mais uma vez e parafraseando o grande investidor Warren Buffet, “Seja medroso quando os outros estão muito corajosos e deixe para ser valente quando os outros estão apavorados”. No atual momento, notamos que aquela euforia pós-pandemia, amplificada pela “bolha de e-commerce” e por dezenas de IPOs de empresas inexpressivas e em preços estratosféricos perdeu o fôlego completamente. Ainda não podemos dizer que sentimos o cheiro “de sangue nas ruas”, mas claramente encontramos excelentes empresas em múltiplos muito atrativos. Consideramos estes como sendo os melhores momentos de entrada para investidores de longo prazo.


Alocação setorial - GTI Nimrod FIA



Atenciosamente,

André Gordon.

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